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sexta-feira, 29 de maio de 2020

O HOMEM PEIXE


Estou como um tripulante de um submarino.
No aguardo de ouvir da base as orientações de praxe
Para quando passar essa tempestade
Eu, novamente, possa voltar à terra firme.
Preciso recompor o equilíbrio da embarcação.
Ajustar a minha cota periscópica.
Ativar o sonar, momentaneamente desligado.
Buscar o norte de minha bússola,
afim de emergir para ver o mundo lá fora.
Vivo submerso há mais de dois meses.
circundando os estreitos corredores desse barco,
limitando-me a ver, ouvir e ter as mesmas coisas.
Às vezes me acalmo; às vezes, enlouqueço.
Para continuar mantendo-se assim,
em condições de submersão,
preciso é rever o tanque do lastro principal,
a todo instante.
Mas tenho saudades da vida lá fora.
Todo exílio contribui, muitas vezes,
para processos depressivos
que atormentam e nos deixam moralmente abalados.
O trânsito em espaços limitados,
configura-se, muitas vezes,
em difícil exercício de aprisionamento.
Logo eu, que sou alma livre,
marinheiro de requisitar portos e navegar mares.
Quando do comando lá fora,
ouvir que o tempo melhorou,
que a tormenta deixou de arregimentar
os mortos à sua passagem,
serei o primeiro a saltar fora do barco
e correr até a praia,
Vou com ânsias de abraçar a primeira pessoa
que me provar que, lá fora,
longe deste vasto mundo de água e sal
ao qual me recolhi em quarentena,
Torço para que o anzol da Vida normal
desça sobre esse abismo líquido
e pesque esse humano-peixe
em que acabei me transformando.