Semana passada, assistindo a TV Câmara, um parlamentar cearense do
legislativo municipal denunciava o consumo intenso de drogas por torcedores que
foram flagrados fumando maconha e crack nas dependências do PV, durante o jogo
Fortaleza e Ceará. Pedia o representante do povo para que a casa envidasse
esforços no sentido de evitar que isso acontecesse nas dependências da praça de
esportes, por conta de que os drogados acabariam levando a prática do
vandalismo e depredando o patrimônio público.
O legislador estava preocupado com os prejuízos ao
patrimônio público.
Eu, particularmente, tem uma outra visão do problema:
preocupam-me os danos causados ao patrimônio, mas muito mais ainda ao
patrimônio humano de quem se vê vitimizado pela drogadição. Preocupa-me o
número cada vez maior de jovens que se tornam dependentes e clientes de um
supermercado que, hoje em dia, não tem limites. Comercializa-se drogas em todo canto.
E não só os jovens de comportamento equivocado se unem a esse contingente, mas
adultos que engrossam os descaminhos da sua própria evolução.
Mães e pais estão compartilhando desse malsinado comércio do
crack e da cocaína, como nem mesmo na minha época de juventude podíamos
constatar. E era um período de mudanças, onde a revolução do ‘paz e amor’,
exibia uma pretensa liberalidade que , se chocava aos olhos da época, hoje soa
como atitude bastante pueril.
Diante da invasão do crack e da facilidade com que a cocaína
hoje é adquirida por uma clientela que, há dez anos, jamais teria condições
econômicas de adquiri-la, a era dos hippies mais parece estória de carochinha
contada nos dias de hoje.
O livro “Droga! Internar não é prender” do psiquiatra
Odailson da Silva, tem a preocupação com o capital humano. Capital humano, hoje
em dia, a serviço de um modelo consumista alienante que, provoca sonhos em mentes
ainda em formação e que são cooptadas – essas mentes, por forças interessadas
apenas no capital econômico.
O livro do Odailson tem o certificado de quem convive no
dia-a-dia desse mundo que, antes era restrito a uns poucos ‘chefões’ mas que
hoje em dia já se avultou de tal forma que ninguém nem mais sabe quem é o
traficante e quem é o viciado.
A propósito, o Juiz Manuel Clístenes de Façanha e Gonçalves,
ao prefaciar a obra, cita muito acertadamente que hoje não tem mais a figura do
traficante, como dono da única boca de fumo do bairro. “Agora são dezenas de
pequenos traficantes e centenas de aviões que disputam com suas gangues o
controle de tráfico de drogas”.
Agora, junto ao aspecto do vício acomoda-se o interesse da
vantagem, da ganância – que, aliás, é a porta de acesso a terríveis
comprometimentos tanto material quanto moral. É por ganância que o comerciante
frauda no preço e no peso; é por ganância que o político engana seus eleitores;
é por ganância que se alastra a corrupção desmesurada; é por ganância que a
Educação virou comércio e até as próprias religiões, na conquista de almas para
ampliar suas contas bancárias, deixam o espiritual e se dedicam a salvar a alma
de seus patrimônios.
Diante de um mundo cada vez mais individualista, o jovem
toma como modelo, os exemplos de uma sociedade distanciada dos valores éticos e
morais que sábios nos deixaram. Diante da família desajustada, do ambiente cultural
comprometido pela mediocridade, ele busca fugas. E sabemos todos que, mesmo os
indivíduos mais bem ajustados se tornam clientes
das multinacionais da química, acabam também se tornando dependentes de
remédios para emagrecer, engordar, dormir, acordar, e até para fazer sexo. Iludidos por essa cornucópia de desejos, os
jovens mergulham no desgraçado poço das drogas, onde a bebida – fartamente colocada
à mão de qualquer, em qualquer lugar (vide o caso da Fifa) - a bebida é o primeiro degrau para essa escada
do horror , que não é ascendente. Ela leva sempre o viciado para baixo.
O que fazer diante de tudo isso? Como agir? Como tratar? O
Estado, no afã de se ver livre de um problema, faz a limpeza das ruas, como
para tirar o lixo da vista de todos. Manda as vítimas do crack para internatos
que, na verdade, não dispõem de parâmetros para reajustá-los e devolvê-los à
sociedade. Centros de recuperação são abertos, alguns responsáveis, outros
interessados em usufruir as verbas do sistema e acabam misturando religiosismo –
e não religiosidade – com a necessidade de humanizar e espiritualizar essa
gente.
“A internação precede à prisãoassim como a doença é anterior
ao crime”, afirma com segurança Odailson nesta obra, que tem tudo para
inquietar a todos nós. Principalmente, porque ele conhece o problema de cor.
Porque ele trata de adictos, mas não apenas pelo viés da Ciência fria e sim
pelo conhecimento espiritualista que sua alma comporta nesta existência. Pelos
valores espirituais que precisam ser fermentados com o exemplo, com o modelo –
não só para os doentes do crack, mas para seus familiares e suas amizades.
Porque afinal, o viciado é apenas a ponta do iceberg de um drama social e existencial que confunde a todos nós. A ponto de um político pedir providências para evitar que as vítimas desse cancro de final dos tempos possa prejudicar o patrimônio público – que achamos correto, defendê-lo. Mas o patrimônio humano é ainda a prioridade de quem enxerga apenas o rótulo e não a essência. De quem vê a caixa e não o produto. De quem não compreende que o valor da Vida está, principalmente, no capital humano.
Odailson entende o problema. E o livro seu livro nos provoca: "Droga! Internar não é prender" O caminho é aprender. E o livro ensina.
Porque afinal, o viciado é apenas a ponta do iceberg de um drama social e existencial que confunde a todos nós. A ponto de um político pedir providências para evitar que as vítimas desse cancro de final dos tempos possa prejudicar o patrimônio público – que achamos correto, defendê-lo. Mas o patrimônio humano é ainda a prioridade de quem enxerga apenas o rótulo e não a essência. De quem vê a caixa e não o produto. De quem não compreende que o valor da Vida está, principalmente, no capital humano.
Odailson entende o problema. E o livro seu livro nos provoca: "Droga! Internar não é prender" O caminho é aprender. E o livro ensina.
(Discurso a ser proferido dia 2 de abril de 2012
na Academia Cearense de Letras, durante o
lançamento do livro "Drogas! Internar não é prender"
do psiquiatra Oldailson da Silva)