POÉTICA. Os dois cães que alimento
de Nonato Albuquerque (31 de janeiro de 2017)
Há um cão dentro em mim que ladra e morde
toda vez que uma palavra insana o provoca.
Reage bruto e rude, desde que assim o acorde
E dê a ração da qual se alimenta em sua toca
Há, no entanto, um outro cão, sereno e calmo,
Que se faz prestativo e dócil, um cão presente.
Que me dá segurança e comigo, palmo a palmo,
Anda, assim eu o deseje, assim eu o alimente.
Vez em quando me flagro intempestivo e forte
A bramir raivoso o instinto que eu comporte;
É que dou talas para que o cão se mostre audaz.
Toda vez, porém, que um gesto meu insista
Em ser calmo e dócil, o que mais exponho à vista
É o cão sereno em mim que vence o cão mordaz.